“Entre e sente-se”.
“Está confortável? Hum… bom, então vamos começar”.
Ele me convidara para seu castelo no alto das montanhas, na beira de um penhasco altíssimo. Seu nome é Manfred Alkiostoff Bratovitch, Lorde de um enorme castelo e vastidões de terras.
“Está bem acomodado? Deseja uma xícara de chá?”
Sempre muito gentil e hospitaleiro.
Lorde Bratovitch convidou-me para escrever para ele sua história de vida. Para isto eu deveria permanecer em sua residência durante o tempo que fosse necessário para o término do escrito. Pagar-me-ia muito bem, algo que ele sempre foi — generoso ao extremo.
O uivo dos lobos constantes deixava um clima sombrio e lúgubre nas noites em que nos encontramos. Sim, apenas nos encontrávamos nas noites, Lorde Bratovitch era um homem muito ocupado durante o dia e apenas tinha tempo durante a noite. As quais nós nos reuníamos em belas salas ornamentadas com lareiras e grandes mesas. Ou mesmo sentados ao chão, com almofadas antiquadas e carpetes persas.
Para falar a verdade, eu mesmo nunca encontrava com Lorde B. durante o dia — como eu me referia a ele, sem estar na presença dele, claro. — Tinha acesso a diversas áreas do castelo. Os servos sempre muito atentos e dispostos a me prestar serviços. Quando eu perguntava sobre o lorde, eles apenas desconversavam e falavam o quanto seu senhor era generoso.
Vamos então ao início da história de Lorde Bratovitch.
O ano é 1282 da Era de Nosso Senhor. Lorde B. disse-me ter nascido de uma família de linhagem real, mas que nunca haviam, de fato, herdado o trono. Apenas detinham o título de nobreza.
Filho do Conde Abrastophilos Jiylgas Bratovitch e Amélia Cassyars DeCáurs e irmão de seis irmãos e três irmãs, era o sétimo filho do conde.
“Com meus irmãos aprendi a arte de esgrimar.” Dizia ele. “Muitas das vezes eu saia ferido, e no outro dia voltava para aprender novamente. Não, eu não odiava meus irmãos. Mas poderia matá-los se assim o fosse. Assim foi, bom chegarei lá.”
Confesso que me assustei quando ele disse que poderia matar seus irmãos, mas estou antecipando demais. Tem muita coisa para contar. Ouvi coisas que jamais pensei ouvir em vida.
Lorde B. veste-se impecavelmente. Seus dedos são revestidos por anéis de ouro e prata cravejados de gemas e brilhantes. É um homem alto, pelo menos vinte centímetros mais alto que eu, que sou de estatura mediana.
Seus olhos são de uma profundidade animalesca. Às vezes parecem crepitar chamas no lugar de suas pupilas, mas creio que sejam apenas as longas horas das quais passamos juntos e o uivo infindável dos lobos dos bosques próximos.
Voltando a vida do senhor do castelo, ele contou um caso mais avançado de sua vida. Quando tinha pouco mais de quarenta anos e participou do primeiro combate real ao lado de seus dois irmãos mais velhos Vylkran e Melkrilav.
“Vylkran e Melkrilav estavam mais a frente montados em cavalos. Ambos vestiam armaduras com elmos e portavam lanças e espadas. Eu estava caído ao chão e havia sido ferido por uma seta inimiga.”
Ele fez um sinal aonde a seta havia atingido seu corpo, embaixo da axila.
“Acabamos sendo capturados. Meus irmãos e eu não conseguimos derrotar o exército inimigo. Melkrilav, o quinto filho foi morto em batalha. Vylkran — o segundo filho — e eu fomos aprisionados.”
“Fomos levados para uma fortaleza, na verdade, um posto avançado. E aprisionados. Aqueles que nós combatíamos nos ameaçaram e brincaram conosco, como se fôssemos animais. Talvez fosse o que meus irmãos faziam comigo em nossos treinos. Acabou, que depois de três dias aprisionados; um dos guardas disse que um de nós poderia ser liberto: Àquele que fosse capaz de matar o outro num combate.”
Lorde B. caminhou de um lado para o outro.
— Aceita um pouco mais? — ele me perguntou oferecendo mais vinho.
— Obrigado. — aceitei de bom grado.
Como era doce e suave o vinho que ele me servira.
— É de uma safra antiga, guardada por meus ancestrais. — disse ele parecendo responder ao meu pensamento.
Às vezes parece que ele faz isso, sabe. Parece estar atentamente ligado aos meus pensamentos e responde coisas que nem disse a ele. Mas não sei. Acho que isso não pode ser possível. — me benzia várias vezes quando pensava nisso. Rezava também ao bom Senhor Jesus.
— Então… o senhor matou o seu irmão? — perguntei descontraído. Acho que o álcool já agia em mim.
— Vamos voltar à narrativa, então… — disse ele. — Meu irmão e eu fomos levados a uma arena improvisada. Cercada por estacas grandes de madeira que faziam o cercado e nos impedia de fugir. Ao redor, havia bancos e arquibancadas. Era uma arena de morte.
“Eu portava uma lança e um escudo. Meu irmão um mangual. A batalha foi sangrenta. Tive um dos braços quebrados, o que eu protegia com o escudo. Meu irmão golpeou-me tão violentamente que chegou a amassr o escudo e quebrou o meu braço.”
“Também não fiquei atrás. Arranquei um dos olhos dele com um golpe de raspão com minha lança. E feri sua perna quando a trespassei.”
Quanto mais conversávamos e eu anotava sua história, Lorde B. me servia mais vinho e ele também bebia em seu cálice de prata.
“Nossa luta, no entanto, foi interrompida. O posto avançado foi atacado. Meu irmão e eu cessamos o combate desconfiando que fossem nossos irmãos vindo ao nosso encontro. Mas estávamos errados. Um exército ainda pior do que os que combatíamos dizimou nossos inimigos e novamente, meu irmão e eu fomos aprisionados.”
“Aqueles cavaleiros sem nome, sem reino vinham em busca de apenas um propósito: sangue. Eles nos levaram para terras longínquas, para longe da Romênia. Não sei exatamente para onde. Lá fomos postos para continuar nosso combate.”
“Mas desta vez sem as armas mortais que carregávamos. Deixaram conosco apenas uma adaga para cada um. E assim voltamos ao nosso combate, uma luta até a morte. Dilaceramos um a pele do outro. O sangue jorrando e a multidão indo à loucura. A luta agora se dava no pátio interno de um castelo. A neve caia fraca, mas o frio gelava nossos corpos fragilizados e debilitados.”
“Num último ataque, Vylkran desesperado e cego de um olho, atacou-me e perfurou minha barriga. Eu tive forças para apenas cravar a minha adaga em seu ombro, mas acabei acertando uma artéria e ele sangrou até a morte. Não teria um fim muito diferente. Caí e o encontraria na morte, ao menos eu pensei que seria isto.”
Ele parou de falar.
Levantou-se e olhou para a escuridão das montanhas lá fora, pela janela.
— O que foi que aconteceu? — perguntei temendo ouvir a resposta. — Como o senhor sobreviveu?
Ele não respondeu, parecia perdido em seus próprios pensamentos.
Quando se virou, parecia estar diferente. Talvez ajeitado o cabelo de forma diferente. Parecia ter cortado o cabelo, mas impossível, não daria tempo. Acho que eu estava realmente bêbado.
— Acho que bebeu o bastante sim, senhor Vallerious. — disse ele mais uma vez respondendo aos meus pensamentos. — Mas ainda há algo que preciso fazer, antes de dispensá-lo por esta noite. Um lugar que preciso lhe mostrar.
Acompanhei-o seguindo pelos corredores do castelo. Cada passo que eu dava era difícil, a bebida me entorpecia. Tudo parecia girar.
Chegamos a uma área que eu nunca havia visitado. Um calabouço, ao menos era isso que parecia ser. Os passos das botas grossas que Lorde B. calçava ecoavam cada vez que ele avançava. O restante era um silêncio mortal que perpetuava o recinto.
Passamos por portas de metal, as quais eu não prestei muita atenção. Talvez mesmo que estivesse lúcido não iria me atentar demais, com medo do que poderia haver ali.
Lorde B. abre uma porta no fim do corredor e adentramos.
Uma sala de tortura. Definitivamente foi a primeira impressão que tive daquele local.
Uma cama no centro da sala com amarras de couro e correntes. No teto havia mais correntes e ganchos de diversos tamanhos. Uma fornalha em um canto e instrumentos para operação em outro. E o que mais me amedrontou e desesperou: o cheiro de carne queimada, sangue e morte.
Quando pensei em dar meia volta e fugir dali, ouvi em minha mente a voz grave de Lorde B. “Não há escapatória”. Sua voz soou em minha cabeça como se ele falasse diretamente dentro dela.
Comecei a gritar e tentei correr pelo corredor, mas fui suspenso por uma mão forte que me jogou para dentro da sala. Voou sobre mim e caímos no chão, derrubando a bandeja com os instrumentos cirúrgicos.
Seus olhos brilhavam em um vermelho intenso, sobrenatural, monstruoso — demoníaco. “Deite-se e cale-se”. Novamente veio sua ordem mental.
Sem que eu quisesse, me levantei e deitei na cama e quando fui dar por mim, estava amarrado pelos pulsos e tornozelos.
— O que vai fazer comigo? Quem é o senhor, o que é você? Vai me matar?
— Acalme-se jovem Velkran… — ele disse calmamente. — Uma pergunta de cada vez.
De repente começou a rir. Uma risada cruel e ao mesmo tempo histérica e de alegria. É importante ressaltar que eu nunca havia visto Lorde B. esboçar um sorriso que fosse. Seu rosto frio e calculista estava sempre fechado, não aparentava maldade, apenas frieza. Nunca pensei que fosse o louco que mostrou ser agora.
— Quem sou eu? — novamente ele riu. — Vou contar-lhe. Não precisa se apressar. Mas agora, se eu vou te matar? Não, não. Você precisa viver muitas noites. Preciso de você vivo, pelo menos por enquanto.
Da mesma forma inesperada que se tornou um gargalhador exaustivo, ele voltou a sua frieza racional e calculista.
O lorde começou a massagear seu rosto e o cheiro de carne queimada exalava dele. Pude ver que seu cabelo negro escorria pelos ombros, caindo. Quando ele terminou o processo, vi sua verdadeira forma, ao menos era algo que eu nunca havia imaginado ver. Nem ao menos em existir, apenas em histórias de demônios contadas pela Santa Igreja.
Seu rosto se tornou esguio e cadavérico. Chifres brotavam de sua testa. Sua pele parecia ser formada por um couro grosso e rígido, de aparência áspera. Seus olhos mais incandescentes do que nunca me fuzilavam e metiam medo. Sua boca se arreganhou e, antes que eu desmaiasse, avisei grandes presas, como dos lobos que eu tanto odiava junto aos seus uivos incessantes.
Gritei de dor quando senti seus caninos rasgando minha pele. Ele abocanhara meu pescoço e sugava meu sangue. Uma única palavra veio a minha mente antes que eu desmaiasse: vampyr — Vampiros, demônios noturnos bebedores de sangue.
Quando acordei sentia muita dor e ardência por todo corpo. Dor semelhante de quando nos queimamos com fogo, mas esta dor era em todo o corpo.
Eu estava sozinho na câmara. Tentei me mover, sem sucesso. Estava ainda imobilizado naquela cama, mas desta vez, ela se encontrava disposta na vertical e eu podia observar a sala. Era grande, com cantos escuros. Dois castiçais iluminavam uma mesa com papéis e um tinteiro.
Quando olhei para baixo vi uma camada espessa de banha e uma massa escura chuviscada por sangue coagulado. Foi quando tive uma visão ainda pior.
Minha pele havia sido arrancada de mim. Eu estava apenas no músculo. Podia ver cada camada de meus músculos se entrelaçando. Comecei a gritar desesperado.
Não sei quanto tempo fiquei daquele jeito.
Criados vinham até mim e me serviam alimentos. Lorde B. sumiu por alguns dias, na verdade, noites. Pois era um vampiro, agora mais do que comprovado. E quando surgia, fazia com que eu bebesse seu sangue. Eu tentava resistir, mas de alguma forma me sentia motivado a fazê-lo. E depois de algumas vezes, achei bom, era… Deliciosamente excitante!
Tentei subornar os criados para que me tirassem dali, mas eles se mostravam leais ao extremo para com seu senhor. Alguns chegaram a me esbofetear e chicotear. Mas paravam depois de três ou quatro golpes. Ouvi um ou outro sussurrar algo sobre — o mestre o quer vivo.
Tempos depois o lorde voltou e arrastava com ele para a câmara algo grande e pesado. Quando puxou o ser para mais perto de mim, percebi ser um grande urso marrom. Eu falava com ele, xingando-o e insultando-o, ele não se alterava.
— Pronto para continuarmos nossa história? — perguntou ele como se ainda estivéssemos naquela velha noite e que nada tivesse acontecido.
Tentei argumentar e pedir para que fosse poupado, mas ele não parecia ouvir.
— Pelo amor de Deus, me tire daqui. Deixe-me viver! — eu bradava.
— Pelo amor de seu Deus Pregado-à-cruz eu o deixei viver, por algum acaso eu o matei?
“Fui levados por aqueles que nos havia prendido e consagrado vampiro. Você deve saber o processo, morder, doar sangue e a metamorfose foi feita. Não pense que foi tão fácil quanto parece. Quase morri no processo e fui trancafiado numa urna e jogado num rio.”
“Não sei por onde naveguei nem por quanto tempo. Quando tive forças e fome, a sede por sangue; arranquei o tampão do caixão e sai. Estava atracado à margem de uma cachoeira. Sozinho e com fome, no meio do nada, busquei pelo meu alimento. Sobrevivi aquela noite graças aos treinos com meus irmãos no trato com animais e caça.”
“Eu teria medo de mim mesmo, você sabe, você agora está temendo a mim, não é? Sabe muito bem o demônio que eu sou. Posso ouvir sua alma gritar isso silenciosamente.”
Novamente ele teve um acesso de risos. E novamente cessou invariavelmente.
“Minha primeira vítima foi um gamo. De alguma forma ele não fugia de mim e pude tocá-lo e abatê-lo. Bebi seu sangue até a última gota. Quando me recuperei do êxtase, percebi que havia arrancado a cabeça do veado e uma marca de queimadura havia ficado no local. Minhas mãos pareciam ter esquentado a ponto de derreter a pele dele… Como eu adorei isto.”
“Eu conhecia a história dos vampyrs. Sabia que eles eram destruídos pelo fogo e pelo sol. Que temiam o alho e símbolos religiosos. E que estacas cravadas em seu coração poderiam matá-los. Metade disso é bobagem, a outra metade é mera lenda quase fictícia. Quase nada é verdade.”
Enquanto conversava comigo contando suas primeiras noites como vampiro, Lorde B. cortava as patas do urso com as próprias mãos. Era realmente como ele dizia: suas mãos podiam derreter a pele do vigoroso urso como se fossem neve. Era assustador!
— Assustador? Você ainda não viu nada. Acalme-se, você é muito apressado. — ele se levantou e levou as patas para perto de mim, colocando-as sobre uma mesa pequena. Depois fez umas anotações em alguns pergaminhos, em outra mesa.
“Depois de muito vagar por terras selvagens, consegui um cavalo e alcancei uma aldeia. Lá consegui roupas novas e testei a mim mesmo como um vampyr. Estava aprendendo a ser um assassino da noite. E estava adorando.”
“Sabia que podia enxergar no escuro, ouvir e sentir cheiros a distâncias incríveis, tal como um predador; pois era o que eu era: um predador. Com um pouco de concentração eu conseguia compreender e fazer-me compreensível a animais. Alguns são idiotas demais para compreender ordens mais complexas. Mas, por exemplo, o cavalo que consegui compreendeu bem quando disse “leve-me onde existam outros que nem a mim”.”
“Eu havia sido transformado com quase quarenta anos. Levei quase um ano para poder voltar a minha gente, não a minha família mortal. E sim a minha gente, a espécie superior. Nós os vampyr.”
Era asquerosa a forma com que ele se achava superior. E mais ainda nojento eu me sentia, porque nada podia fazer; indefeso e imóvel preso àquela mesa de tortura.
— Eu não ia fazer isto agora, mas já que você se mostra tão insensível… — disse ele enquanto estalava os dedos. — Ai, ai senhor Vallerious… Está me saindo um menino muito mau.
Quando vi o que eram seus dedos comecei a chorar de desespero. Seus dedos haviam se alongado a ponto de se parecer com garras animalescas. Suas unhas eram enormes, como garras de grandes felinos.
Ele tocou meu ombro e meu braço e começou a cortá-lo! Ele iria arrancar meus braços! A dor era trucidante. Senti que urina escorria por minha perna, ao mesmo tempo em que fezes escorriam pela mesa e caíam no chão.
“Uma mulher elegante e muito linda… linda não: deslumbrante. Talvez a mulher mais linda que eu havia visto em minha vida mortal e imortal, surgiu para mim numa noite. Era uma de mim, uma vampyr. Yele era seu nome.”
“— Boa noite criança da noite. — ela me disse. — Sou sua criadora e senhora. A mim você deve respeitar e aprender.”
“Obviamente eu demorei a compreender. Mas ela me explicou calmamente o que havia acontecido. Ela havia me criado e me testado para ver se eu era digno de sua linhagem. Mostrei minha superação ao conseguir alcançá-la de volta a Romênia.”
“— Agora você deve aprender os segredos mais sombrios de nossa espécie.”
“Com ela eu estudei e aprendi. Ensinou-me a arte de Moldar o Corpo, os diferentes estágios e como fazê-lo sem desperdiçar a matéria prima. Mas é um processo doloroso e desgastante. Muitas cobaias acabam morrendo no processo.”
— Não precisa temer Velkran, eu era jovem. Atualmente sei fazer corretamente.
“Estudei diversos campos do Ocultismo e rituais sangrentos e macabros. Muitas das lendas de demônios e magia antiga se mostraram ser apenas lendas, enquanto outras se revelaram para mim como reais e possíveis de serem feitas.”
“Passaram-se alguns anos. Meu corpo se tornou forte e resistente. Minha força também aumentou em grande escala. Não só os segredos da magia Yele me ensinou, com também de nossos dons naturais e da possível história de nossa linhagem.”
“Yele falou sobre anciões que adormeceram e nunca mais foram vistos. Apenas alguns poucos de nós tinham acesso a eles. Haviam outros seres sobrenaturais, lobisomens, fantasmas, demônios, anjos, fadas, múmias, magos… o Mundo Selvagem, ou Tenebroso, de Trevas… Era como ela se referia quando falava deles.”
“Pouco a pouco fui deixando de ser humano. Havia coisas que eu nunca imaginei que pudesse fazer. Participei com ela de rituais sangrentos que envolvia a morte de dezenas de pessoas. Uma orgia de sangue e prazer. Lá vi pela primeira vez a transformação de outro vampyr, a forma zulo, era como eles chamavam.”
Ele parou de falar.
Escuridão.
Acordo.
Sou despertado por um suave beijo.
Quando acordo vejo que uma das servas de Lorde Bratovitch estava em minha frente. Ela tinha um pano úmido em mãos e me olhava com dó.
Carregava também um recipiente com água, havia limpado meu corpo e passado algum tipo de ungüento de ervas nas feridas feitas pelo seu senhor em suas experiências demoníacas.
— Por favor, senhor, não tema. Vou tirá-lo daqui. — disse a jovem moça.
— Não faça nada. Ele irá nos matar. — eu disse com a voz fraca. Não sei quanto tempo estive desacordado. — É muito perigoso.
Ela não me dava ouvidos e continuava a soltar as correias que me prendiam.
Eu mesmo já havia me tornado um monstro. Sem pele cobrindo o corpo, os lábios desfigurados num sorriso eterno. Os olhos esbugalhados sem membrana a cobrir. E agora com braços peludos e fortes, braços de ursos, no lugar de meus próprios.
Caio fraco ao chão quando ela soltou as últimas amarras. Ajudou então a me levantar e seguimos para fora do calabouço. Com cuidado ela me levou por passagens secretas que levariam para longe do castelo.
Quando atingimos o bosque, do lado de fora, estava anoitecendo. — um mau presságio.
Um uivo melancólico e selvagem surgiu nas entranhas da mata escura. O uivo que tanto me assombrava.
Não demorou muito para uma alcatéia surgir por entre os galhos e árvores. Lobos ferozes de olhos amarelos e pelagem escura. Totalizavam cinco, seis, oito… A cada instante apareciam mais. Todos rosnando e nos encurralando contra a rocha onde saía a passagem.
Um dos lobos tomou a frente, um lobo grande cinzento e, como um urso ficou ereto, de duas patas. Após dois passos em nossa direção, transformou-se instantaneamente no odioso Lorde Manfred A. Bratovitch, o demônio.
— Já vão embora? Tão cedo? — perguntou ele olhando para nós. Ele cruza os braços e observa indiferente para nós com aquele olhar impiedoso.
Tentei puxar a moça pela mão e corremos por um dos cantos, tentando passar pelos lobos. Mas fomos perseguidos e encurralados por eles novamente. Lorde B. comandava a eles.
— Tola! — disse o lorde enquanto dava um tapa no rosto da escrava que o traíra. — Como ousa me trair, pagará com a morte.
Sem que ela pudesse responder, ele arranca o coração dela com um único puxão. Antes que ela caia ao chão, ele a suspende e joga para seus lobos famintos, que a devoram ferozmente.
Ele vem até mim lambendo o coração e bebendo todo o sangue, como se fosse uma fruta suculenta.
— Você acha que eu sou mau? — perguntou ele com desdém. — Você ainda não viu o que é a maldade. Não sabe o que é ser cruel. Vamos Velkran, venha. Despeje sua raiva em cima de mim.
Foi o que eu fiz, parti para cima dele.
Usando toda a força que eu tinha de meus novos e abomináveis braços de urso, tentei acertar seu rosto, sem sucesso. Ele foi muito mais veloz e desviou do ataque.
Eu estava fraco, me sentia fraco.
— Você é fraco Velkran. — disse o lorde. — Eu te transformarei em algo mais forte…
— Nunca! Não quero ser como você.
— Como eu? — perguntou ele como se eu tivesse feito a mais estúpida das perguntas. — Nunca! Isto eu não concederei. O Dom Maldito é algo muito secreto e sagrado para lhe entregar. Você será apenas mais do que um Saco de Carne, será um deus entre formigas, de fato. Mas nunca um vampyr. Não-humano e nem vampiro. Apenas um servo útil para meus planos.
Sem mais forças para lutar, desmaiei.
Acordei com o doce gosto do sangue do mestre em minha boca.
— Escravo…
— Sim mestre.
— Muito melhor assim. Vamos concluir minha história. E você estará pronto para me servir.
“Alcancei a forma zulo após muito treino e dedicação. Aprendi também a arte obscura, a feitiçaria negra. Koldun. Podia convocar as chamas profanas do inferno. Poderia destruir até mesmo vampyr inimigos, só de pensar nisso eu me fascino.”
“Depois disso Yele me deixou. Disse que eu já estava pronto e que poderia seguir. Foi o que fiz. Voltei para casa, minha antiga morada. O castelo Bratovitch”
“Meus familiares, aquele gado imbecil havia me dado como morto. Minha mãe, aquela cadela desgraçada havia tido mais filhos. Meu pai já havia até morrido e Joyghr, o filho mais velho de todos, havia assumido como patriarca. Matei todos. Um banho de sangue. E por quê? Capricho, alguns diriam. Eu não. Acho que foi mesmo apenas por diversão, apenas pelo prazer de matar. Afinal, eram apenas carne e sangue.”
“Deste então resido neste castelo. Venho estudando a transformação e cultos antigos. Vez ou outra, ainda me encontro com Yele e outros de nossa linhagem.”
“Se eu nunca encontrei outros? De outra espécie? Hum… sim, já. Tem até um caso que eu deveria ter contato. Mas ainda há tempo. Meu castelo foi invadido por um bando de desgarrados. Vampyrs sem objetivo, cujos únicos ideais são matar, beber sangue e continuar… Feras sem rumo.”
“Quando invadiram minha casa, os meus domínios eu me revoltei. Queimei-los em meu fogo profano e os que consegui capturar ainda com vida, bom… tiveram um fim ainda pior. Pois não tiveram uma morte tão rápida…”
— Este sou eu. — meu mestre disse. — Manfred Alkiostoff Bratovitch, seu senhor. Senhor destas terras e até aonde seus olhos mortais podem ver.
Ele me soltou e depois me conduziu até o saguão de entrada de seu castelo.
— Deixe-me vê-lo Velkran, deixe-me ver a bela arte que eu acabei de criar. Ah, está perfeito.
Velkran Arthoris Vallerious,
Carniçal de Lorde Bratovitch
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